Bernie Sanders: o fracasso que não o foi
- Alexandre Matos
- 18 de jan. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 20 de jan. de 2021

Bernie Sanders foi, mais uma vez, o segundo candidato a reunir os votos de mais delegados nas primárias democratas para a presidência do país. Depois de ter ficado atrás de Hillary Clinton em 2016, foi Biden quem conseguiu derrotar o Senador em 2020. Bernie parecia bem encaminhado para a vitória depois de ter ganho as três primeiras primárias, apenas para depois ter sido derrotado pela ala mais moderada do partido, encabeçada por Joe Biden.
Rui Tavares, historiador e fundador do LIVRE, falou em entrevista ao Jornal Espectro do panorama político norte-americano e de Bernie Sanders, candidato que apoiou e por quem fez campanha. Não considera que as eleições tenham corrido mal a Bernie, afirmando que o que ele fez foi até algo inédito. Sanders considera-se um socialista, designação que é considerada, ou pelo menos era até há muito pouco tempo, suícidio político dentro dos EUA.
Mesmo Obama, que se considerava de esquerda, tinha receio em afirmá-lo publicamente. Rui Tavares esteve em 2008 no país a cobrir as eleições e conta que, ao ler os seus dois livros na altura, encontrou apenas uma referência ao facto de ser de esquerda. “Portanto, havia uma vez em 400 páginas que ele admitia ser um homem de esquerda. Via-se que o assumia, mas que era uma coisa quase escondida na política americana”.
O socialismo sempre foi uma arma política muito forte nos EUA, e qualquer candidato que se alinhasse minimamente com seus valores era de imediato chutado para canto. De certa forma, Bernie Sanders veio mudar isso. Mas apesar de apenas ter ganho mais popularidade a nível nacional mais recentemente, o discurso de Bernie é o mesmo desde os anos 70, afirma Rui Tavares. “É um tipo que a gente ouve o discurso dele há 20 ou 30 anos e é quase igual ao mesmo de hoje, dos primeiros a falar de Ecologia na política americana… há uma série de elementos que são exatamente iguais. E, portanto, isso é um grande sucesso”.
Apoiado muito por uma geração mais nova de norte-americanos, que não viveram a Guerra Fria e a propaganda anti-socialista e anti-comunista no seu estado mais intensivo, o Senador do Vermont tem mostrado que é possível competir nas mais altas eleições, e tem inspirado uma série de novos políticos que se identificam com os valores da social-democracia.
Alexandria Ocasio-Cortez, mais conhecida por AOC, é o nome mais sonante desta nova ala progressista do partido. E é esta ala que tem trazido novas e mais inovadoras ideias ao partido Democrata. A Medicare4All, proposta de um Serviço Nacional de Saúde de Bernie Sanders, é uma das mais importantes para a esquerda do partido. Apesar de ser uma ideia muito contestada pelos republicanos e até por uma ala mais centrista dos democratas, a medida tem uma taxa de aprovação a rondar os 70% a nível nacional.
Uma das outras grandes bandeiras dos progressistas americanos é o Green New Deal. Esta medida é também apoiada por Rui Tavares e pelo LIVRE, que pedem que esta seja implementada a nível europeu. O objetivo é implementar uma economia verde, sustentável e capaz de criar milhares de postos de emprego. Como fez o histórico presidente dos EUA Franklin D. Roosevelt (FDR) com o New Deal na altura da crise dos anos 30.
Na opinião do historiador, há muita gente nos EUA que está a começar a olhar para as ideias progressistas de uma outra maneira, e muito devido aos muitos anos de propaganda anti-socialista. “Eu acho é que muita gente começa a pensar que ter um serviço nacional de saúde, segurança social e não morrer em tiroteios, se isso é socialismo não é assim tão mau, pelos vistos”.
E Bernie, para Rui Tavares, tem tido muito sucesso em transmitir as suas ideias. Primeiro, como já foi dito anteriormente, porque as diz desde sempre, e segundo porque não conta a sua história, como muitos políticos norte-americanos, mas sim aquilo em que acredita.
O Bernie faz exatamente o contrário. "Vocês não estão aqui para ouvir falar de mim, não estão aqui para ouvir falar se nasci no Brooklyn, se os meus pais eram refugiados judeus, se estudei numa Universidade de Chicago, se fui preso em manifestações pelos direitos civis. Estão aqui para ouvir falar de desigualdade, desemprego e falta de acesso aos cuidados de saúde e agora, durante uma hora, vou-vos dar uma seca, que nem um professor universitário, de administração pública e finanças"
E fá-lo sempre sem perder o seu público.
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