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O que esperar de uma presidência de Joe Biden

  • Foto do escritor: Alexandre Matos
    Alexandre Matos
  • 24 de dez. de 2020
  • 6 min de leitura

Não foi um processo fácil, mas a transição para uma administração Biden-Harris já está a ser feita. Falta já menos de um mês para a sua inauguração, com muito trabalho a ter que sei feito logo nos primeiros dias. A grande questão neste momento é como é que o presidente-eleito vai lidar com todos os problemas que os EUA (e todo o mundo) enfrentam?


Fotografia: Joe Raedle - Getty Images

Para perceber melhor como será a presidência de Joe Biden, importa primeiro perceber um bocado melhor como foi a longa carreira do político. Concorreu como Democrata em todas as suas eleições, mas ele próprio admite que inicialmente “sentia-se Republicano”. Contudo, na primeira vez que se registou, acabou por não escolher o Partido Republicano por não gostar do presidente na altura, Richard Nixon.


Foi eleito pela primeira vez para o Senado em 1972, tendo exercido funções entre janeiro de 1973 e janeiro de 2009, quando assumiu a vice-presidência na administração de Barack Obama. Como Democrata no Senado, Biden sempre esteve la ala mais conservadora do partido. Considerava-se mais liberal em questões relacionadas com os direitos e liberdades humanas e saúde, mas mais conservador no que dizia respeito ao aborto e ao serviço militar.


Sempre foi um político que trabalhou muito com os dois lados, ganhando uma reputação de centrista moderado. Em 1984, foi o Democrata que mais apoiou uma legislação sobre o crime, a Comprehensive Crime Control Act. Com o passar dos anos, a lei foi cada vez mais mal vista, sendo agora considerada por todos como sendo demasiada dura. Biden, durante a sua campanha mais recente em 2019, admitiu que o seu apoio pela legislação foi um erro.


Mas, fiel com a sua própria representação política, enquanto que passava leis mais conservadoras em relação a questões judiciais, continuava com a sua forte advocação em relações aos direitos humanos. Em 1986 fez um discurso arrebatador sobre o Apartheid na África do Sul:


Em 1987 lançou a sua primeira candidatura para a presidência dos EUA. Contudo, ainda nas primárias Democratas, foi obrigado a desistir depois de várias acusações de plágio nos seus discursos e de mentiras em relação à sua licenciatura.


Outra das suas posições mais criticadas nos dias de hoje é a sua oposição ao uso de autocarros públicos para levar crianças mais desprivilegiadas para a escola. Foi Kamala Harris, quem depois até escolheu para ser a sua vice-presidente, e que será a primeira mulher na Casa Branca, que o confrontou com este facto nas primárias destas eleições.


Em 1994, foi um dos grandes defensores e legisladores por trás da famosa Crime Bill. No seu discurso perante o Senado aquando da votação, Biden falou da necessidade de “recuperar as ruas” e desvalorizou o facto de certos indivíduos terem tido infâncias perturbadas, más educações e vidas complicadas, apelando a que estas sejam condenadas da mesma maneira.



A sua dualidade entre alinhar com Republicanos em certas questões e ser um dos pioneiros entre os Democratas noutras sempre foi muito presente. Ainda na sua Crime Bill, incluiu uma secção que protegia a mulheres de violência doméstica.


Ao longo da sua carreira, teve também outros votos contestados pela ala mais progressista do seu partido. Em 1993 votou a favor de uma lei que, em termos práticos, bania homossexuais de servirem nas forças militares norte-americanas. Em 1996 votou favoravelmente o Defense of Marriage Act, que proibia casamentos entre o mesmo sexo.


Em 2007 anunciou a sua segunda candidatura para a presidência. Contudo, depois da sua campanha ter sido afetada por comentários e de não ter conseguido um bom resultado na primeira primária, acaba por ter que desistir da corrida. Desta vez, foram palavras sobre Barack Obama com interpretações racistas que contribuíram para o seu afastamento da luta pelo cargo mais alto dos EUA. Como sempre ao longo da sua carreira, Biden aceitou as críticas e pediu desculpa.


Curiosamente, foi escolhido por Obama, o primeiro presidente afro-americano da história do país, para ser o seu vice-presidente. A decisão foi vista na altura como uma tentativa de Barack Obama de unir o partido, ao escolher alguém que tinha criticado fortemente durante a primária. A experiência que Biden foi acumulando no Senado, e principalmente o seu registo em questões de política externa, foi, porventura, a maior razão pela sua escolha.


Susan Walsh - Associated Press

Durante os seus 8 anos na Casa Branca, Biden destacou-se pelo seu papel como mediador dos assuntos relacionados com o Iraque no seu primeiro mandato, e foi destacado por Obama para lidar com as questões relacionadas a violência de armas no seu segundo mandato, no seguimento do atentado de Sandy Hook.


Uma vida cheia de tragédias pessoais, depois de ter perdido a sua primeira mulher e filha num acidente de carro meses antes do seu primeiro mandato como senador em 1972, culminou na morte do seu filho mais velho – Beau Biden – em 2015. Visto por muitos, incluindo o próprio pai, como uma versão mais nova de Joe, o seu falecimento atingiu o vice-presidente de forma muito forte. Biden pareceu envelhecer muito no seu último ano na Casa Branca, e isso pode ter tido uma forte influência na sua decisão de não concorrer nas eleições de 2016.


Contudo, Biden voltou a reaparecer em 2019 para lançar a sua derradeira candidatura. Tinha como maiores adversários à partida Bernie Sanders e Elizabeth Warren, ambos da ala mais à esquerda dentro do partido democrático. Joe começou mal as primárias, e com pouco financiamento, chegou-se a falar da sua possível desistência.


Evan Vucci - Associated Press

Bernie ganhou as primárias nos três primeiros Estados – Iowa, New Hampshire e Nevada – e parecia estar bem encaminhado para ser o candidato democrata às eleições de outubro. Contudo, na South Carolina, 4ª primária, Biden conseguiu um grande resultado com o voto afro-americano, e venceu com uma vantagem de quase 30%. A partir daí, os candidatos também eles mais moderados – Pete Buttigieg e Amy Klobuchar – desistiram das suas candidaturas para a apoiar o antigo vice-presidente dos EUA.


Seguiu-se a “Super Tuesday”, dia em que 15 Estados decidem o candidato do partido, em que Biden, já com o apoio dos democratas que haviam suspendido as suas campanhas, triunfou em grande, vencendo em 10 dos Estados.


A corrida ficou definitivamente a dois, entre Biden e Sanders, sendo que apenas Elizabeth Warren resistia dos restantes candidatos. Quando a Senadora finalmente decidiu sair da corrida, havia muita expetativa para ver quem esta iria apoiar: se era Bernie, com quem ela se identifica mais em termos ideológicos, ou Biden, o candidato que na altura liderava as primárias. Warren escolheu o segundo, e partir daí Sanders ficou praticamente sem hipótese.


Joe Biden acabou consagrado como o candidato democrata, já com o apoio de Bernie Sanders. Para sua vice-presidente, Biden tirou uma página do livro do seu antigo presidente, Obama. Escolheu Kamala Harris, também ela candidata nas primárias, e com quem havia chocado anteriormente.


Olivier Douliery - AFP

Biden era claramente o candidato mais moderado no partido Democrata (excluindo Bloomberg, que apenas entrou na corrida pela sua fortuna). Foi principalmente isto que lhe valeu a nomeação. Mas o antigo vice-presidente mostrou sempre vontade, quer motivada por questões ideológicas quer por questões políticas, de fazer algumas concessões mais à esquerda. A sua deslocação mais à esquerda em certas questões foi a forma que Biden encontrou de conseguir o apoio de Warren e Sanders e, consequentemente, unir o partido.


Biden tem apoiado fortemente a proposta de Bernie Sanders de subir o salário mínimo nacional para 15$ à hora. Apoiou, quer parcialmente quer totalmente, medidas como o perdão das dívidas para estudantes universitários, tornar as faculdades públicas completamente grátis, expansão do serviço Medicare e ainda tem mostrado apoio pelo plano de reforma da bancarrota de Warren.


Apesar de não dar essa ideia inicialmente, Biden tem mostrado que pode vir a ser o presidente mais progressista que os EUA já viu, caso venha a cumprir e executar algumas das promessas que fez ao longo da sua campanha relacionadas com a economia, a crise climática e saúde. A nível dos principais problemas que o país enfrenta, estas são algumas das principais medidas do presidente-eleito:


Infografia: Marta Antunes Rodrigues

Contudo, enfrenta também, como Obama em grande parte dos seus mandatos, um Senado com maioria republicana que pode travar grande parte da sua legislação. É verdade que Biden tem um longo historial de trabalhar com Mitch McConnell, o líder do GOP no Senado, mas o senador certamente não facilitará a aprovação de grande parte da sua agenda mais à esquerda.


Neste sentido, a ala mais progressista tem, desde a eleição, feito pressão em Biden para que este concretize as medidas a que se propôs através do seu poder executivo, com as chamadas Executive Orders e através da nomeação de ministros que se alinhem com a legislação de Biden.


Não será fácil para Biden conseguir agradar todo partido Democrata e ainda a fação mais moderada do partido Republicano que votou em si. Dentro do seu próprio partido, há já alguma tensão e pressão. Bernie Sanders disse logo quando desistiu da sua candidatura que iria fazer tudo o que podia para eleger Biden, mas que depois iria aplicar um forte escrutínio nas suas ações caso este fosse eleito.


Tendo também em conta que é expectável que apenas sirva durante um mandato (Biden vai ser o presidente mais velho da história ao chegar à Casa Branca com 78 anos), e que entra no trabalho com uma das maiores crises que o país já sentiu, há muita expectativa para ver o que o presidente-eleito consegue fazer e ainda sobre quem será o seu sucessor em 2024.



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